21.10.17

Os leguminhos, por Kelly Garcia

Na manhã de hoje (21/10/17), nossa escola recebeu a visita da escritora Kelly Garcia, residente em Belo Horizonte (MG) e criadora de Os leguminhos.

Kelly apresentou o seu projeto para professores, alunos, pais e equipe pedagógica da escola, bem como as inúmeras possibilidades para utilizá-lo na sala de aula e contribuir para melhoria da alimentação dos estudantes.

Alimentação saudável, orgânica, livre de agrotóxicos e equilíbrio entre seres humanos e natureza foram alguns dos eixos temáticos trabalhados nos livros, vídeos e jogos produzidos pela autora, os quais de maneira lúdica favorecem uma aprendizagem dinâmica e prazerosa.

Nós agradecemos a escritora por sua disponibilidade e boa vontade por nos atender e a parabenizamos pelo brilhantismo de sua criatividade e o sucesso de seu projeto!

Conheça mais sobre Os leguminhos - a turma da proteção acessando, seguindo e se inscrevendo nas redes sociais abaixo:

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19.10.17

Triatoma bacalaureatus - a maior doença do Brasil

Ao publicar o seu livro Problema Vital, em 1918, Monteiro Lobato reunia num só volume diversos artigos que escrevera nas páginas do Estadão tentando convencer as elites brasileiras acerca da necessidade de sanear o país.

A campanha pelo saneamento rural dos sertões brasileiros, lugar que para os poetas e autores românticos citadinos era descrito como "eden embalsamado de manacás" (p. 253), fora diagnosticado pelos médicos como um "imenso hospital".
Assim, a voz de Lobato unia-se à causa dos médicos sanitaristas, como Miguel Pereira, Arthur Neiva e Belisário Penna, todos defensores do higienismo e do saneamento do país.

A campanha médica era encarada pelos profissionais da saúde e por parte da imprensa como uma cruzada patriótica, pois era necessário erradicar as doenças, sobretudo a tríade maldita (Ancilostomose - Mal de Chagas - Malária) para pôr o povo de pé.

Lobato defendia que os higienistas se tornassem os protagonistas da república, substituindo o bacharelismo e a velha  classe política, a qual nada havia realizado em prol da população, por novos gestores competentes que fossem capazes de implementar uma política nacional de saúde. A base desta mudança era Manguinhos, onde Oswaldo Cruz havia estruturado um grande laboratório. Dele "tem vindo, vem, e virá a verdade que salva - essa verdade científica que sai núa de arrebiques do campo do miscroscopio" (p. 244).

Para o criador do Jeca Tatu a ciência e o microscópio, revelador dos micróbios e de bactérias, revelavam a verdade e podiam minimizar os males do povo. Se todas as doenças não eram curáveis, pelos menos eram evitáveis com a adoção de hábitos de higiene, medidas profiláticas, isolamento e tratamento de pessoas contaminadas e outras mudanças na cultura do povo.
Uma das mudanças preconizadas por Lobato dizia respeito sobre os métodos curativos populares, já criticados por ele em Urupês e retomados em Problema Vital. O autor atacou as crendices populares, as práticas curativas e os curandeiros, considerando essas medidas inócuas. Tais práticas representavam o obscurantismo e a ignorância  mediante a medicina científica, a qual deveria ser expandida por todos os rincões do país, afim de assegurar a nacionalidade, revitalizando milhões de brasileiros, livrando-os de sua condição doentia e improdutiva. 
Para os homens de sciencia era necessário combater o "charlatanismo", isto é, os curandeiros, práticos, herbalistas e todos aqueles que praticavam a medicina não institucional dentro do território nacional (Ver SCHWARCZ, 1993, p. 291). Desse modo, a medicina científica se afirmava perante a sociedade.
Em meio a um país de pessoas exangues, Lobato questionava a importância de se reformar a constituição, o código eleitoral ou fixar o serviço militar. Esses temas tomavam a atenção do Congresso, sobrepujando o debate sobre a saúde pública. Do que adiantaria aquelas discussões se a população dos sertões estava abandonada à própria sorte pelos bacharéis (Triatoma bacalaureatus) da república? Sanear, portanto, deveria ser a prioridade dos governos e dos particulares. Afinal, argumenta o criador do Sítio do Pica-pau Amarelo, a economia, as finanças, a justiça, a cidadania, a agricultura e a indústria dependiam primeiro da existência de um povo saudável.

Sem saúde, sem educação e abandonado pelo poder público, o caboclo, explorado pelos chefes locais, não tinha outra opção, senão recorrer à cachaça na tentativa de esquecer os seus problemas. A bebida, além de enfraquecer ainda mais um organismo já debilitado por germes causadores das patologias, causava além da degenerescência física e racial, desvios morais, como a demência e a criminalidade. 
Reverberando as palavras dos higienistas, Lobato decretou: "Sanear é a grande questão", e prossegue, só "a alta crescente do indice da saude coletiva trará a solução do problema economico, do problema imigratorio, do problema financeiro, do problema militar e do problema politico" (p. 272).

Entretanto, para desfazer a grande mazela nacional apontada na obra de Monteiro Lobato, urgia ao Brasil combater, paralelamente às doenças, outro mal - o parasitismo de nossa classe política, o Triatoma bacalaureatus, aqueles que "ousam tudo!" (p. 261).
O autor apontava que o "Brasil é a terra onde um parafuso qualquer da maquina governamental, prefeito de Camara ou ministro de Estado, tem o direito de "ousar tudo", escudado pela mais completa irresponsabilidade" (p. 261). Esses "parafusos" eram intocáveis, pois nada lhes acontecia, nem mesmo a justiça os punia por eventuais irregularidades cometidas no exercício do poder.  

A política havia virado "um privilegio restrito com feroz exclusivismo á casta dos mais audaciosos amorais" e se constituía num "fenomeno social consorciado ao estudo patologico da nação" (p. 262). Não havia vez e nem voz para o povo, tampouco para uma administração pública eficaz e racional. Vamos lembrar que na época em que publicou o mencionado livro predominava no cenário político brasileiro o "voto de cabresto", práticas coronelísticas e a questão social era vista como caso de polícia. Enfim, a cidadania era prerrogativa para poucos enquanto a maioria da população era escravizada para proveito e manutenção dos privilégios daqueles que ocupavam os cargos de poder.

Lobato considerava imoral o fato do "subjugado que se deixa espoliar sem um gesto de reação", mas o povo não reagia pois estava adoecido, incapaz de lutar e de resistir à opressão que lhe fora imposta. Logo, não se enxergava nas elites o interesse em curar e revigorar as populações sertanejas, pois que, uma vez saudáveis, poderiam se rebelar contra o jugo e a tirania. Eis o motivo para manter o povo doente, é o que nos sugere o autor, a existência de uma aliança natural de parasitas internos (micróbios) e externos (políticos). "Eis aí a trave maior oposta á ideia do saneamento, ideia só será vitoriosa em uma ou outra zona privilegiada do país" (p. 263).
Lobato estava certo nesse aspecto, somente áreas privilegiadas, como os centros políticos e financeiros importantes, Rio de Janeiro e São Paulo, os portos e, posteriormente, áreas rurais com valor econômico foram assistidas pelas campanhas sanitárias. Locais mais longínquos, com menos densidade demográfica e sem atividades econômicas relevantes para a balança comercial foram preteridos.

Monteiro Lobato foi um nome importantíssimo na campanha, incompleta, em prol do saneamento rural do Brasil. Seus artigos e seu livro reverberavam os dados levantados por médicos ligados à Manguinhos sobre a morbidade assustadora do povo brasileiro. Sua intenção, enquanto editor, publicista, autor, nacionalista e homem desejoso do desenvolvimento econômico era convencer a elite culta, letrada e política do país acerca da importância do higienismo e do saneamento. Teve êxito nessa empreitada. Antes, Lobato fora convencido pelos médicos e expoentes do movimento sanitário de que sem saúde o povo continuaria a "vegetar de cócoras" e o país jamais produziria a riqueza que se esperava de tão vasta nação. Esse processo foi crucial para a revisão da visão lobatiana sobre o sertanejo, que pode ser sintetizada na epígrafe "O Jéca não é assim; está assim". Com isso, acreditava que o homem brasileiro valeria tanto quanto um europeu, e se o elemento nacional produzia menos que o estrangeiro não era por conta de sua condição mestiça (questão da inferioridade racial), mas pelo abandono do governo brasileiro que não amparava o povo em suas mínimas necessidades, como saúde e educação.

Hoje, podemos apontar que a análise trazida a lume por Problema Vital era monocausal, bem como a solução para o problema apresentado na obra. Sabemos que devido à complexidade histórica da sociedade brasileira e das gritantes desigualdades regionais e sociais, medidas unilaterais são insuficientes para atender às demandas da população. Ações no campo da higiene e do saneamento são necessárias até os dias atuais em muitas cidades brasileiras, mas se não vierem acompanhadas de outras medidas governamentais, como investimentos em infra-estrutura, cultura, educação, trabalho, inclusão social, renda e justiça jamais serão capazes de superar nossas deficiências e colocar o Brasil nos trilhos do pleno desenvolvimento.   



LOBATO, José Bento Monteiro. Mr. Slang e o Brasil e Problema vital. São Paulo: Editora Brasiliense, 1951.

18.10.17

Ex-aluno do CIEP 280 tem conquista reconhecida pelo poder Legislativo

O poder legislativo do município do Carmo-RJ reconheceu a conquista de Otávio, ex-aluno do CIEP 280, pela conquista do segundo lugar no Concurso literário e artístico da Academia Leopoldinense de Letras e Artes, em agosto do corrente ano.

Otávio recebeu Moção de Congratulações e Aplausos, iniciativa da vereadora Faninha, pelo desempenho obtido no certame com a charge Game of Thrones Brazil.


Parabéns, Otávio. Você tem talento, continue se dedicando às artes.

17.10.17

Feliz dia do professor!


Por Mirian Kunha, professora.

Parabéns para nós professores!! E nesse 15 de Outubro eu desejo a todos ...

- Um salário digno!
- Uma sala de aula com a quantidade adequada de alunos!
- Bons cursos de formação continuada!
- Boas condições de trabalho!
- Internet Banda Larga nas escolas!
- Tratamento respeitoso!
- Fim do assédio moral!
- Mais investimento do poder público!
- Respeito ao PNE!
- Respeito a 1/3 do planejamento!
- Material didático suficiente e de qualidade!
- Laboratórios de ciências e informática em funcionamento!
- Ambientes com boa infraestrutura!
- Água potável!
- Ambiente limpo!
- Bom preparo para lidar com educandos portadores de necessidades especiais!
- Trabalhar em um ambiente sem violência!
- Fim da aprovação automática!
- Participação efetiva da família!
- Um ambiente prazeroso!
- Poder contar com uma gestão realmente democrática!
- Reconhecimento!
- Não desempenhar múltiplas funções!
- Não sofrer de síndrome de burnout!
- Acumular o mínimo de serviço em casa!
- Direito a liberdade!
- Direito a uma escola crítica!
- Mais paciência para enfrentar as adversidades!
- Ter momentos de lazer!
- Interesse dos alunos pelos estudos!
- Valorização da prática docente!
- Uma aposentadoria digna!
- Respeito ao plano de cargos e salários!
- Maior oportunidade de aquisição intelectual!
- Menos papelada para preencher, menos burocracia!
- Ter direito ao descanso!
- Uma biblioteca atualizada e de boa qualidade!
- Viver em um país que reconheça a importância do professor não somente no dia 15 de Outubro, mas em todos os dias do ano! Parabéns professores!!

15.10.17

Diário de Ywesky Borislav: Das estradas locais

Página V: Das estradas locais

Vivo entre Minas e Rio, faço pouso aqui e acolá e tiro meu sustento fazendo pequenos serviços, reparos, obras e, sobretudo, do comércio de mercadorias, como milho, batata doce, fumo, mandioca e aves, que levo de um lugar para o outro no lombo de uma mula.

E como essa vida de caixeiro viajante é sofrida, principalmente porque padecemos da falta de estradas, em ambos os estados. Aqui no interior, os caminhos são terríveis e não é raro cruzar com carros de boi com rodas empenadas, acidentes e caminhões com pneus furados. 

Um presidente da república, Dr. Washington Luís, disse que "governar era abrir estradas". Em seu governo construiu algumas, mas privilegiou o litoral e seu lema não inspirou os dirigentes e chefes políticos dessa região, para minha infelicidade. Pois aqui, lamentavelmente, estrada esburacada é a regra.

Cá estou eu refletindo com meus botões. 
_ Por que diacho não se fazem estradas decentes por aqui?

A resposta me pareceu bastante óbvia, especialmente, quando se observa as propostas dos candidatos aos cargos públicos. Em todas elas constavam a promessa: "se eleito for vou construir e consertar nossas estradas".
Aí pensei, todos aqueles homens nobres e capazes disputando cadeiras na Câmara e uma promessa em comum e relativamente fácil de ser cumprida: cuidar das vias locais.

Porém, após a eleição o que se verifica é uma operaçãozinha tapa-buracos, cujo prazo de validade vai até a primeira chuva... Depois disso, só se fala em estradas novamente no próximo pleito eleitoral. Enfim, o tema da manutenção das estradas atraí votos, a proposta mais criativa e mais elaborada vence e quem perde é o povo, pois ninguém resolve o problema. A desgraça de alguns, isto é, daqueles que necessitam das estradas para viver, faz a alegria de outros, os quais tiram proveito das necessidades alheias para capitalizar votos nas eleições com ideais falsos e mesquinhos.

Um pensador afirmou que no Brasil não há, entre nossos dirigentes, a "mentalidade estradeira", eles não compreendem que são pelas vias de trânsito que trafegam a riqueza, a cultura, a educação, a saúde, o conhecimento. Ora, as estradas movem (ou engessam) um país, mas me parece que por aqui, nossos nobilíssimos doutores preferem nos deixar inertes, sem movimento e sem desenvolvimento.
Que pena! 

13.10.17

Diário de Ywesky Borislav - Parte IV: Assim se faz política por aqui

Página IV

Legislatores

Em 1941, resolvi assistir à uma reunião na câmara dos vereadores do município do interior do Rio, na pacata e refrescante região Serrana. Na ocasião, os nobres edis debatiam como deveria se chamar uma ponte recém-construída e que precisava de um nome para a solenidade de inauguração.

A ponte era importante, ligava a cidade ao estado de Minas Gerais e seria uma via essencial para o escoamento de mercadorias e trocas comerciais entre as duas unidades da federação. 

O debate perdurou por horas, um grupo de vereadores defendia que a ponte recebesse o nome do falecido pai do atual chefe do executivo, o qual, no passado, também havia exercido o cargo. Do outro lado, advogava-se em prol do avô do candidato preterido pelo governo estadual quando ocorrera a nomeação para o cargo de prefeito.

Já era tarde da noite quando houve um acordo pela aprovação unânime em favor do finado e genitor do atual prefeito. Um dos argumentos que o grupo da posição utilizou foi o fato de que o outro nome sugerido pelos vereadores ainda vivia, por isso não seria homenageado agora. Mais tarde, soube por um dos cidadãos que assistia àquela cena que o prefeito enviara um recado ao presidente da casa e pressionara os legisladores a darem à ponte o nome de seu pai, senão ele dificultaria certos serviços indicados pelos vereadores, como limpeza das ruas, poda das árvores, manutenção da iluminação à gás em certos bairros, cessão de homens e ferramentas para reparos nas cercanias etc. Pronto, bastou o tom mais firme que os vereadores aprovaram o indicativo rapidamente, mesmo depois de exaustivo, controverso, duradouro e inócuo debate.

Legislar, ninguém legisla, tampouco se preocupam com os problemas fundamentais da população. Todos estavam centrados apenas na questão do nome da ponte e na perpetuação da memória daquelas poucas famílias ligadas ao poder. Ninguém ali se preocupou com o aumento da sujeira e da imundície no leito do rio devido à ocupação desordenada de suas margens, por centenas de famílias que não tinham onde viver. Como não havia água encanada, esgotamento e nem coleta de lixo para essa gente, toda sorte de lixo eram despejada no rio, o que causava redução do número de peixes, assoreamento, escassez da água e surto de doenças. O que aquela gente poderia fazer se não havia nenhuma política municipal ou estadual de moradia para atender aos pobres. 

Um vereador até suscitou uma questão relevante sobre a necessidade de despoluir o rio, recolher o lixo que flutuava por aquelas águas a fim de melhorar o mau cheiro que ele exalava, mas foi logo interrompido por um de seus pares o qual alegou que da limpeza do local cuidariam os diligentes urubus. Portanto, não haveria necessidade alguma de gastar os recursos do erário com uma atividade dispendiosa e que não traria benefício algum.

Fiquei estarrecido com o consentimento dos demais vereadores com esse último aparte que pôs fim à questão da higiene nas imediações do rio. Me perguntei se aqueles vereadores tinham real conhecimento das condições de vida daquelas famílias ribeirinhas, se eles sabiam que o virgula morbus enfileirava cadáveres, sobretudo de crianças, que habitavam aquele lugar decrépito e se tinham noção de que a falta de higiene e de saneamento estava a ceifar vidas preciosas... 

Enfim, acabei me indignando e resolvi me retirar do recinto antes do término da sessão. Conclui que política local é uma grande baboseira, pois as pessoas ocupam os cargos públicos visando exclusivamente o benefício próprio, sem se preocupar com a coletividade e com algo tão importante que é a assistência aos desvalidos e desafortunados, cuja saúde e o bem-estar, lamentavelmente, não são objeto de preocupação dos homens que estão no poder. 

5.10.17

Diário de Ywesky Borislav - III

Parte III - Política e Poder

Desde tempos imemoriais que os grupos humanos se organizaram em sociedades, mais ou menos civilizadas, e, através de um pacto social, deram origem ao Estado cuja função essencial é governar os homens, coibindo os excessos, a violência e assegurando-lhes a liberdade e a propriedade.

A partir de então, homens e grupos organizados, como os partidos políticos, por exemplo, têm buscado incessantemente chegar ao poder e por vários motivos: Alguns almejam fortalecer a missão natural do Estado, criando leis que fixam direitos e deveres para todos os cidadãos; Outros, porém, por motivos menos nobres, desejam exercer os cargos de comando por mera vaidade, por despotismo ou para servir aos interesses do grande capital e do corporativismo, mesmo que isso custe sacrificar o próprio povo com a retirada de direitos elementares, como a liberdade de expressão, os direitos políticos e civis. 

A meu ver a primeira motivação seria a ideal para o país, pois ela visa o bem-estar coletivo e garantias fundamentais para a cidadania, o que asseguraria alguma coesão e estabilidade social. A última razão que move os homens aos cargos eletivos, no entanto, é perversa, cruel e tirânica, pois a coisa pública é colocada à serviço de interesses privados e escusos.   

Na capital da república ou aqui no interior, o jogo político é bem semelhante e, embora o volume e a intensidade sejam diferentes entre as regiões, o fazer político no Brasil, de modo geral, é algo vil e torpe. Aqui o poder é exercido não para promover o bem comum, mas para fortalecer pequenos grupos que se apossaram do Estado nacional. O projeto de nação desses que assaltaram o poder é dividir, fragmentar e acalçar a população com o aumento dos impostos, congelamento de salários, manutenção do trabalho servil e degradante, sem oferecer à classe pobre e produtora de riquezas quaisquer condições básicas para uma existência digna. Conclui que é devido à manutenção do projeto de segregação que a classe dirigente nunca investiu em educação neste país, transformando o povo numa massa amorfa, ignorante que se deixa manipular docilmente.

Ouvi, certa vez, de um antigo operário que morou na capital em 1919, um relato de seu encontro com Rui Barbosa em plena campanha presidencial. O operário assistiu à famosa  conferência no Teatro Lírico. Os trabalhadores que foram ouvir o "Águia de Haia" estavam entusiasmados, pois o candidato prometera tratar a questão social no Brasil com o devido cuidado, proibindo o trabalho de crianças nas fábricas, reduzindo as horas da jornada diária e construindo habitações decentes para os trabalhadores. O velho me disse disse que as pessoas gritavam: 

_ Agora questão social não será mais caso de polícia no Brasil. Um viva para Rui, nosso presidente!

Infelizmente, Rui Barbosa perdeu a eleição e o seu eleitorado as esperanças de um futuro diferente. Entretanto, o célebre jurista brasileiro falou naquela oportunidade, dentre tantas coisas importantes, algo que marcou o senhor com quem conversava. Segundo ele, Rui disse que havia duas maneiras de por fim num mau governo: uma seria pelo voto e a outra maneira pela revolução. No Brasil, pelo voto, sempre vence o mau governo. Logo, pensei: 

_ Será que algum dia esse povo será capaz de sublevar-se contra os seus opressores, como fizeram os russos?! 

Enfim, prosseguindo, acho que foi o autor de Dom Quixote que afirmou: "Ah, memória, inimiga mortal do meu repouso!" Estou cá deitado numa rede, numa velha hospedaria, à luz fraca de uma vela e não posso dormir sem antes registrar uma lembrança que me ocorrera agora das aulas de filosofia no mosteiro.

Certa vez o professor, um clérigo que lecionava na escola religiosa, falava que a fome era um mal que corrompia o país e lembrou o exemplo de Jesus Cristo que a combatia, multiplicava o pão e os peixes e os repartia para os pobres. Então, um dos colegas de turma, questionou:

_ Professor, pela atitude de Cristo podemos afirmar que ele era socialista?

O professor franziu o semblante e seus olhos ficaram nublados de ira antes de repreender severamente o aluno:

_ Que heresia! Não ouse comparar as ações de Cristo com um aventureiro qualquer do século XIX, o qual era um lunático, obcecado por ideias sem fundamento, tampouco aplicáveis à realidade. Pela sua estupidez receberá doze palmadas, concluiu o mestre.

A sala emudeceu, o silêncio só era rompido quando a palmatória atingia o alvo, provocando ranger de dentes no colega de classe, que pagou caro por tentar comparar o cristianismo com uma doutrina revolucionária e anti-clerical, como o marxismo.   


Borislav (1918-1990).