23.4.12

O problema que ninguém quer enxergar

No período eleitoral a Educação é tema recorrente nos discursos dos candidatos. Todos falam da importância de se investir mais na educação, melhorar as escolas, aumentar os salários dos profissionais da educação, desenvolver projetos e etc...

Políticos, empresários e, praticamente, todos os demais segmentos da sociedade, admitem a importância da Educação para a vida das pessoas e do futuro do país. Quase todos são unânimes em apontar, sem grandes dificuldades, que a Educação, apesar de tão importante, passa por graves problemas no país.

O que sobra no discurso político - teorias, promessas e soluções mirabolantes para a resolução dos problemas educacionais - falta na prática, pois a realidade da Educação é terrível, cruel e massacra os agentes que estão diretamente envolvidos com o cotidiano educacional.

Recentemente, eu estava em um consultório médico e enquanto aguardava o atendimento comecei a folhear uma revista Veja, por falta de opção, já que grande parte dos médicos-intelectuais-formadores de opinião assinam a referida publicação. E passando as páginas encontrei um texto interessante, abordando a educação, escrito por Lya Luft, na edição de setembro de 2011.

O texto não apresenta nenhuma novidade, mas expõe valores e questões educacionais relativamente simples, que funcionavam no passado, mas foram abandonados pela política nacional da educação atual, a qual tem transformado a escola em uma indústria-empresa. Essa empresa precisa, a qualquer custo, "produzir" maiores números de alunos aprovados e melhores resultados em avaliações externas (provas do governo).

O artigo também critica a falta de ação de nossos governantes, e com razão, pois a maioria trata a Educação como uma plataforma para angariar mais votos nas eleições. São estes políticos, que após eleitos, fingem não enxergar os problemas nacionais, trabalham por outros interesses, e se esquecem de agir em prol do bem estar dos governados.

Vale a pena reprouzir o texto de Lya Luft:

Educação: reprovada

Há quem diga que sou otimista demais. Há quem diga que sou pessimista. Talvez eu tente apenas ser uma pessoa observadora habitante deste planeta, deste país. Uma colunista com temas repetidos. Ah, sim, os que me impactam mais, os que me preocupam mais, às vezes os que me encantam particularmente.

Uma das grandes preocupações de qualquer ser pensante por aqui é a educação. Fala-se muito, grita-se muito, escreve-se, haja teorias e reclamações. Ação? Muito pouca, que eu perceba. Os males foram-se acumulando de tal jeito que é difícil reorganizar o caos.

Há coisa de trinta anos, eu ainda professora universitária, recebíamos as primeiras levas de alunos saídos de escolas enfraquecidas pelas providências negativas: tiraram um ano de estudo da meninada, tiraram latim, tiraram francês, foram tirando a seriedade, o trabalho: era a moda do “aprender brincando”. Nada de esforço, punição nem pensar, portanto recompensas perderam o sentido. Contaram-me recentemente que em muitas escolas não se deve mais falar em “reprovação, reprovado”, pois isso pode traumatizar o aluno, marca-lo desfavoravelmente. Então, por que estudar, por que lutar, por que tentar?

“Cansei das falas grandiloquentes sobre educação, enquanto não se faz quase nada. Falar já gastou, já cansou, já desiludiu, já perdeu a graça”.

De todos os modos facilitamos a vida dos estudantes, deixando-os cada vez mais despreparados para a vida e o mercado de trabalho. Empresas reclamam da dificuldade de encontrar mão de obra qualificada, médicos e advogados quase não sabem escrever, alunos de universidades que têm problemas para articular o pensamento, para argumentar, para escrever o que pensam. São, de certa forma, analfabetos. Aliás, o analfabetismo devasta este país. Não é alfabetizado quem sabe assinar o nome, mas quem o saber assinar embaixo de um texto que leu e entendeu. Portanto, a porcentagem de alfabetizados é incrivelmente baixa.

Agora sai na imprensa um relatório alarmante. Metade das crianças brasileiras na terceira série do elementar não sabem ler bem escrever. Não entende para que serve a pontuação em um texto. Não sabe ler as horas e minutos num relógio, não sabe que centímetros é uma medida de comprimento. Quase a metade dos mais adiantadas escreve mal, quase 60% têm dificuldades graves com números. Grande contingentes de jovens chega às universidades sem saber redigir um texto simples, pois não sabem pensar, muito menos expressar-se por escrito. Parafraseando um especialista, estamos produzindo estudantes analfabetos.

Naturalmente, a boa ou razoável escolarização é muito maior em escolas particulares: professores menos mal pagos, instalações melhores, algum livro na biblioteca, crianças mais bem alimentadas e saudáveis – pois o estado não cumpre o seu papel de garantir a todo cidadão (especialmente à criança) a necessária condição de saúde, moradia e alimentação.

Faxinar a miséria, louvável desejo da nossa presidenta, é essencial para nossa dignidade. Faxinar a ignorância – que é uma outra forma de miséria – exigiria que nos orçamentos da União e dos estados a educação, como a saúde, tivesse uma posição privilegiada. Não há dinheiro, dizem. Mas políticos aumentam seus salários de maneira vergonhosa, a coisa pública gasta nem se sabe direito onde, enquanto preparamos gerações de ignorantes, criados sem limites, na lhes é exigido, devem aprender brincando. Não lhes impuseram a mais elementar disciplina, como se não soubéssemos que escola, família, a vida sobretudo, se constroem em parte de erro e acerto, e esforço.

Mas se não podemos reprovar os alunos, se não temos mesas e cadeiras confortáveis e teto sólido sobe nossa cabeça nas salas de aula, como exigir aplicação, esforço, disciplina e limites, para o natural crescimento de cada um?

Cansei de falas grandiloquentes sobre educação, enquanto não se faz quase nada. Falar já gastou, já cansou, já desiludiu, já perdeu a graça. Precisamos de atos e fatos, orçamentos em que educação e saúde (para poder ir a escola, prestar atenção, estudar, render e crescer) tenham um peso considerável: fora isso, não haverá solução. A educação brasileira continuará, como agora, escandalosamente reprovada.

2 comentários:

  1. Oi Rodolfo, beleza? Preciso que escreva meia lauda para a minha mono, sobre a nossa interdisciplinaridade feita ano passado, lembra?
    Quebra essa pro Eddye.

    O artigo que fez está ótimo, garimpei um pouco do Lima barreto e coloca ai pra geral:


    Lima Barreto, em seus artigos, comenta essa situação.
    Disse anteontem alguma coisa sôbre a instrução e não me julgo satisfeito. O govêrno do Brasil, tanto imperial como republicano, tem sido madrasta a êsse respeito. No que toca a instrução primária generalizada, coisa em que não tenho fé alguma, tôda a gente sabe o que tem sido. No tocante a instrução secundária, limitaram-se, os governos, a criar liceus nas capitais e aqui, no Rio, o Colégio Pedro II e o Militar. Todos êles são instituições fechadas, requisitando para a matrícula de alunos nos mesmos, exigências tais, que, se fôsse no tempo de Luís XV, Napoleão não se teria feito na Escola Real de Brienne. Ambos, e, sobretudo, o Colégio Militar, custam os olhos da cara e o dinheiro gasto com êles dava para mais três ou quatro colégios de instrução secundária neste distrito. (Continuo..., p.93) VU4 – 13/03/1915

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  2. Fala Eddy, conte comigo, escreverei a lauda solicitada.
    E obrigado por enriquecer o post com informações de Lima Barreto.

    Grande abraço.

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Obrigado pelo comentário.