15.11.14

Res publica

A expressão res publica vem do latim e designa "coisa pública". 
O aperfeiçoamento do termo pelos Antigos Romanos originou a República, um governo voltado a atender aos interesses do povo.

Entretanto, antes da República romana ser colocada em prática em 509 a. C., os gregos, ou melhor, um filósofo grego teorizava a respeito dessa forma de governo.

Estamos nos referindo a Platão (427 a 347 a. C.), em cuja obra, intitulada "República", disserta sobre o modelo ideal de governo capaz de zelar pelos homens. 

Na República platônica, de forma sucinta, o poder deveria ficar a cargo dos filósofos, pois eles eram considerados os mais próximos da verdade, do bem e da justiça, portanto seriam os indivíduos com melhor preparo moral e intelectual para gerir a política e a sociedade.

Com a conquista do território grego pelos expansionistas romanos, muito da cultura helênica fora incorporada pelos latinos.
Em 509 a. C., com o fim da monarquia em Roma, foi instalada uma República no conglomerado urbano mais importante do Lácio.

De acordo com Cícero, filósofo e político romano, a República surgiu para “homens associados pelo direito a partir de interesses que lhes são comuns. A associação pelo direito pressupõe a existência de leis e, para promover os interesses comuns, essas leis devem ser a expressão da vontade popular.”

Porém, para o escritor americano Stanley Bing, a República romana escapava à idealização feita por Cícero, como podemos perceber no trecho:

"À direita, havia um Senado corrupto e fechado cioso de seus poderes e privilégios, disposto a tudo para manter o status quo. Eram os patrícios, os optimates. Naquela que poderia passar por esquerda, havia homens do povo, que haviam conseguido poder e riqueza não por herança, mas pelo suor e pelo sangue de seus filhos e ancestrais. Eram os populares." (2008. p. 61)

Conflitos, ciladas, assassinatos e golpes faziam parte do jogo de poder na república romana antiga. Nela os interesses e as necessidades do povo tinham reduzida importância para os senadores e para os cônsules, os quais estavam mais preocupados em expandir seus domínios e aumentar suas riquezas às custas dos tributos pagos pela plebe ou trabalho realizado por escravos, além do sangue derramado pelos soldados nas províncias que Roma conquistava.

Em 27 a. C., a República chegou ao fim, quando tem início o Império Romano dos Césares.

Todavia, essa forma de governo volta à tona no século XVIII. Tanto nas Treze Colônias Inglesas da América do Norte (1776) quanto na França (1789) ocorrem profundas mudanças políticas e sociais, que resultam na substituição dos seus atuais governos pela República.

Nesse contexto, as repúblicas americana e francesa estão embebidas pelas ideias iluministas, as quais defendiam os direitos de liberdade e de igualdade entre os homens. Porém, na prática, os direitos nas novas repúblicas restringiam-se a homens livres. As mulheres eram excluídas e também os escravos, os quais foram mantidos nas colônicas francesas e na nova nação norte-americana.

O Brasil igualmente teve sua experiência republicana, embora tardiamente, tendo em vista que nossos vizinhos latinos optaram pela república logo que conquistaram suas independências políticas, ao longo do século XIX. 

Aqui, a partir de 1822, o Brasil foi o único país a manter um regime monárquico, com o objetivo de preservar a unidade territorial, o latifúndio e o escravismo.

Desde o final do século XVIII, a antiga colônia portuguesa enfrentou movimentos que defendiam  as ideias republicanas, caso das Conjurações Mineira e Baiana - severamente sufocados pela ordem vigente. 

No segundo reinado, a aprovação de leis abolicionistas contribuíram para que a elite rural tomasse certa aversão ao governo imperial, agora visto como uma instituição arcaica e incapaz de promover o progresso nacional.

Assim, em 15 de novembro de 1889, chegara ao fim a monarquia e fora proclamada a República no Brasil.
Militares proclamando a República no Brasil. E o povo?
Sobre esse fato, o historiador Bóris Fausto registra que: 

“A proclamação da República correspondeu ao encontro de duas forças diversas – Exército e fazendeiros de café – movidos por razões diversas. O Exército tinha motivos de ordem corporativa e ideológica para se opor à monarquia. (...) os fazendeiros paulistas, através do partido republicano paulista, moviam-se por razões claramente econômicas”. (FAUSTO, B. 1972).

Não há, portanto, no processo de transição da monarquia para a república, nenhum indício de grande mobilização e participação popular. Os processos políticos eram sempre conduzidos pelas elites. As massas populares serviam apenas para serem manipuladas, por meio dos órgãos de imprensa, chefes locais e de uma política modernizante, mas conservadora, que concedia, em doses homeopáticas, alguns direitos, ao passo que reforçava o controle dos grupos dominantes, principalmente econômicos, sobre os rumos do novo regime.

O pesquisador Lorenzo Aldé lembra que:

"Nos séculos XX e XXI, nossa República – apesar dos trancos e barrancos ditatoriais no meio do caminho – consolidou-se e ampliou enormemente os direitos dos cidadãos. Mas a tortuosa trajetória do republicanismo brasileiro deixa uma lição sempre válida: de nada valem princípios igualitários formais se a cultura da desigualdade impede seu cumprimento. Como diz a voz do povo: “na prática, a teoria é outra coisa”." (Revista de História online).

Apesar da ampliação dos direitos civis, políticos e sociais, a "tortuosa trajetória" de nossa República parece não ter fim. Sai governo e entra governo e os escândalos de corrupção e desvios de verbas públicas para pequenos grupos privados se sucedem.

Em junho de 2013, o povo brasileiro tomou as ruas de todo o país, reivindicando, dentre várias coisas, moralidade e ética na condução da coisa pública. 


Cerca de 50 mil manifestantes protestando no centro de São Paulo (18/06/13)
Afinal todos estão demasiadamente cansados e exauridos desta República fraudulenta, na qual os interesses escusos e privados se sobrepõem aos interesses públicos. 

Não queremos mais uma república para poucos. 
Ex-diretor da Petrobrás é investigado por lavagem de dinheiro com empreiteiras.
Desejamos uma República parecida com aquela descrita pelo grande orador Cícero. Esperamos que os valores fundamentais republicanos sejam resgatados, quem sabe na sonhada reforma política, e que nela vigorem o direito e a lei "para promover os interesses comuns", expressando, democraticamente, a vontade popular.
Assim, tomaremos como prioridade os temas coletivos, em detrimento dos interesses privados, e não haverá espaço para a corrupção (de agentes públicos e de setores empresarias) na coisa pública.

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