Futebol e política, em determinados momentos, caminham lado a lado.
O jogo de sábado entre as seleções do Brasil e Bolívia, na cidade boliviana Santa Cruz de la Sierra, é mais um, dentre outros vários exemplos, que parece comprovar a afirmação acima.
O jogo de amanhã não é um simples amistoso internacional entre as seleções, trata-se de uma iniciativa dos dirigentes do futebol brasileiro em prol da manutenção do bom relacionamento entre as duas nações que disputarão a partida.
A visita da seleção canarinho à Bolívia faz parte de uma homenagem à memória do adolescente Kevin Espada, morto em fevereiro num estádio, enquanto assistia à partida entre os clubes San Jose (Bolívia) e Corinthians (Brasil).
Durante esse jogo, alguns membros da torcida do clube brasileiro atiraram um sinalizador em direção à torcida rival, acertando o garoto, fato que o levou a morte.
Naquela época as autoridades bolivianas detiveram alguns torcedores brasileiros, suspeitos de terem cometido o crime. A imprensa dos dois países fizeram ampla cobertura da tragédia, a diplomacia internacional foi acionada. A embaixada brasileira precisou intervir e acompanhar as investigações e o tratamento que a justiça boliviana dispensava aos presos brasileiros.
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Torcida presta homenagem póstuma a Kevin |
Muitas pessoas ficaram preocupadas com as consequências do ocorrido, que poderia provocar ainda mais violência nos estádios sul americanos durante as competições internacionais. Preocupava a possibilidade de as torcidas brasileiras e bolivianas se confrontarem no futuro, em partidas que opusessem clubes dos dois países.
Para colocar um fim nas hostilidades entre os cidadãos bolivianos e brasileiros, e mostrar o quanto as autoridades do Brasil se sensibilizaram com a tragédia de fevereiro, a seleção brasileira, que em um passado recente ostentava o melhor futebol mundial, visitará a Bolívia para um amistoso internacional.
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Craques como Neymar e Ronaldinho serão atrações no sábado |
Parte da renda do jogo será destinada à família do adolescente morto. Uma homenagem muito válida, apesar de que não há quantia no mundo, nem gols ou dribles desconcertantes, que sejam capazes de amenizar a dor dos familiares, amigos e das pessoas de bem que se solidarizaram com mais uma vítima da violência que permeia o futebol.
A alegria que o futebol proporciona ao povo também servirá para reforçar ainda mais os laços diplomáticos entre os dois países, que há alguns anos sofreu um forte abalo. Em 2006, o presidente da Bolívia - Evo Morales - decretou a nacionalização de duas riquezas do país, o petróleo e o gás. Com essa medida tropas bolivianas invadiram refinarias, inclusive a Petrobrás, que realizava diversas operações de exploração do combustível boliviano. A situação gerou uma crise diplomática entre os países, que acabou contornada pelo presidente Lula e seu ministro das Relações Exteriores. O presidente a Bolívia também percebeu que a parceria com o Brasil era importante, e garantia investimentos e divisas para ambas as partes.
Mas quando a bola rolar, amanhã, ninguém se preocupará com o gás natural, tampouco vai se lembrar da invasão militar de uma refinaria estrangeira ou com as ações que precisam ser adotadas pelos dirigentes políticos e futebolísticos para evitar a violência no futebol da América Latina. Não, amanhã só o que importa é a alegria paralisante do futebol, mesmo que a camisa amarela já não brilhe tanto quanto reluzia em outrora.
Matéria no site da Folha de São Paulo, publicada no dia 07/04/13, sobre o jogo Brasil e Bolívia e seu uso político.
http://www1.folha.uol.com.br/esporte/1258738-uso-politico-de-jogo-rouba-cena-em-goleada-da-selecao-brasileira.shtml